3 passos para uma Cultura de Resultados

Victor Feitosa
Victor Feitosa
Pedro Nascimento, pós júnior da Fluxo Consultoria e VP da Brasil Júnior em 2014, um dos nomes que liderou o processo de criação do jeitoBJ (a cultura organizacional da BJ), diz que existem três passos para a aplicação de uma cultura de resultados.

Ao final da segunda guerra mundial o Japão era um país que havia sofrido muitas baixas e precisava se reerguer desse período sombrio de sua história. Foi nesse cenário de urgência que a Toyota, empresa japonesa, surgiu com uma inovação que, até os dias atuais, é estudada e divulgada ao redor do mundo. O sistema Toyota de produção (STP) surgiu como uma nova abordagem para a linha de produção. Tal sistema aumentava a produtividade e a eficiência, evitando o desperdício como o tempo de espera, superprodução, gargalos de transporte, inventário desnecessário, entre outros. É justo afirmar que tal modelo revolucionou o cenário econômico mundial e garantiu a Toyota a posição de maior empresa automobilística do mundo nos anos 2000.

Décadas depois, diversos livros, artigos e ensaios foram escritos sobre o STP. O modelo foi estudado por diversos profissionais da área, gestores com experiência e executivos de alto escalão que visavam replica-lo em sua própria empresa. Porém, curiosamente, décadas depois, nenhuma organização conseguiu replicar o modelo a exatidão. De fato, a maioria das empresas possuem dificuldade em implementar o STP em sua cadeia de produção. Isso ocorre porque o modelo demanda um alto nível de disciplina de seus funcionários, algo que não pode ser conseguido simplesmente através de processos e ferramentas de gestão. Não basta simplesmente ter os processos da Toyota. Para atingir o mesmo diferencial competitivo, é preciso ir além. Mas o que é esse “além”?

Para respondermos esta pergunta é necessário entendermos o que é diferencial competitivo. Resumidamente, podemos identificar 4 tipos de áreas em que uma empresa pode ser única e se diferenciar. A primeira é nos processos. Assim como a Toyota tinha práticas únicas de produção, seus processos foram muito importantes para lhe conceder sua hegemonia e sustentam seus resultados no dia a dia, mas podem ser copiados com certa facilidade.

A segunda área é nos produtos. Estes são frutos dos processos e, como um pode ser facilmente copiado pela concorrência, o outro, com um pouco mais de esforço, também pode. Um bom exemplo disso é a Apple que, até pouco tempo, possuía produtos com uma qualidade superior à de seus concorrentes. Entretanto, atualmente, quando analisamos apenas a qualidade dos produtos, é justo afirmar que estes não se distinguem da concorrência como era no passado.

Já a terceira área onde pode-se criar um diferencial competitivo é a estratégia. Tal diferencial é mais difícil ainda de superado, pois leva em consideração o longo prazo. Tem a ver com alterações no modelo de negócios da empresa. Um bom exemplo de que possui esse diferencial é a Netflix. O que permitiu a empresa prosperar não foi a forma única como lidava com seus processos, tampouco o seu produto em si, mas sim o seu modelo de negócios que se diferenciava dos demais.

Por fim, existe um quarto tipo de diferencial que não fala sobre aspectos tangíveis da empresa, mas sim sobre hábitos, comportamentos e gente. Este sim é o verdadeiro diferencial competitivo, praticamente impossível de ser copiado e é a razão pela qual a Toyota se tornou o que é hoje. Estamos falando da cultura organizacional. Os processos, produtos e estratégias da Toyota podem ser copiados e adaptados, mas sua cultura é única. É ela que mantem a disciplina dos funcionários e garante que os padrões de comportamento das pessoas guiem a empresa a excelência. A longo prazo, a cultura é o único diferencial competitivo. Mas o que isso quer dizer na prática? O que é a cultura organizacional?

Edgar Schein, um dos maiores especialistas em cultura organizacional, afirma que "um padrão de pressupostos básicos compartilhados aprendidos por um grupo a partir da resolução de seus problemas de adaptação externa e integração interna, que têm funcionado bem o suficiente para serem considerados válidos e, portanto, são ensinados a novos membros como a forma correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas." Entretanto existem dois pontos que é interessante termos definidos a de cultura.

O primeiro é que ela não é criada. Ela simplesmente acontece. Toda vez que um grupo de pessoas se reúne de forma consistente por algum motivo a cultura surge. O segundo ponto é que a cultura pode ser aprendida e internalizada. A partir do momento em que algum indivíduo entra no grupo e passa a conviver com aquela comunidade ele pode internalizar a cultura da mesma.

Tendo estes pontos em mente podemos inferir algumas observações. A primeira é que toda organização já possui uma cultura. Esta pode não estar ligada a resultados ou estar em desalinho com a estratégia da empresa, mas a cultura em si, já existe. Também é importante termos claro que um funcionário pode sim aprender e internalizar uma nova cultura e que fica a cargo da liderança garantir que tal internalização aconteça.

Para entendermos como tal internalização ocorre e como a liderança pode ajudar neste processo revisitamos os estudos de Schein. O autor divide a cultura organizacional em três níveis. São eles: os artefatos, os valores e os pressupostos básicos. Abaixo, segue a definição de cada um.

Artefatos: São fatores visíveis na organização. É o primeiro e mais visível nível da empresa. São inclusos, por exemplo, missão, slogans, as instalações da empresa, mobília, endomarketing, arquétipos e até mesmo o modo de como os funcionários se vestem.

Valores: Especificam o que é importante para os membros de uma cultura. São as crenças principais na qual aquela comunidade se baseia em seu dia a dia e que, embora não sejam de fato tangíveis, como os artefatos, ainda estão no nível consciente da organização.

Pressupostos: O coração da cultura de uma organização. Os pressupostos existem além da consciência e são elementos invisíveis e dificilmente identificados nas interações entre funcionários de uma empresa. Estes representam também o que os membros acreditam ser a realidade, influenciando o que eles sentem e pensam nos aspectos da cultura.

Por vezes estes três níveis podem ser representados em um iceberg onde a parte visível (acima da superfície da agua) seriam os artefatos e a parte submersa seria dividida entre os valores e os pressupostos.

Essa definição é importante para entendermos como podemos implementar uma cultura de resultados na EJ. Trabalhando os artefatos da cultura e cuidando para que estes estejam ligados ou remetam àquilo que a empresa considera como resultados começamos a dar os primeiros passos para moldar a cultura atual da empresa de forma que esta venha a se tornar cada vez mais a cultura de resultados que almejamos. Mas como este processo funcionaria na prática?

Pedro Nascimento, um dos nomes que liderou o processo de criação do jeitoBJ (a cultura organizacional da Brasil Júnior), diz que existem três passos simples, porém trabalhosos que devem ser considerados para a aplicação de uma cultura de resultados.

Passo 1: Olhar para a cultura atual

Nesse momento é importante ter um olhar apreciativo. É claro que muitos pontos de melhoria serão enxergados, mas é importante focar também nos pontos positivos que a cultura atual já possui e que estejam alinhados com os resultados que queremos alcançar. Isto porque a mudança brusca de uma cultura para outra completamente diferente pode gerar um choque muito grande nos membros.

Ao analisar a cultura é importante que todos os membros sejam ouvidos. Estes podem fornecer insumos valiosos a respeito de quais são as crenças e modelos mentais limitantes da organização e quais são os pontos positivos que a cultura atual já possui. É importante também não só olhar para o presente mas para o passado da empresa. Conhecer a história da mesma. Falar com ex-membros. Pedro relata que, quando o Jeito BJ foi criado, todos os ex-diretores a Brasil Júnior foram contatados na esperança de identificar qual é o modelo mental da organização e como este evoluiu ao longo do tempo.

Passo 2: Olhar para a cultura desejável

Para se estabelecer uma cultura de resultados é importante definir o que a empresa tem como arquétipo do "membro ideal", ou seja, que comportamentos ela percebe que precisa ter pra alcançar os resultados que almeja. Este não é um processo que deve ser feito apenas pela diretoria, mas sim por toda a EJ. A todo o momento os membros devem estar sendo inseridos no processo. Caso contrário, a resistência tenderá a aumentar, pois o resultado final pode ser um perfil no qual as pessoas não se enxergam. O ponto mais importante dessa etapa é que a gestão tem que incentivar o que já existe de bom e promover o que ainda não existe, pois, ao criar novos comportamentos, você naturalmente desprioriza os antigos.

Passo 3: fortalecer os comportamentos do arquétipo

Uma vez definido o que é resultado a empresa deve começar a fortalecer os comportamentos do arquétipo que já existem e incentivar os que não existem, passando a utilizar artefatos, rituais, mitos, etc. Se queremos uma cultura de foco em projetos, tudo aquilo que é tangível na empresa deve estar apontando para isso. Assim surgem diversas ideias que vão desde coisas simples como um quadro na parede dizendo quando tem reunião quem é o cliente e quem vai negociar o projeto, até coisas mais trabalhadas como uma reunião mensal de resultados para que possamos deixar claro para toda a empresa o quanto faturamos naquele mês, qual era a meta esperada e qual o plano de ação para o mês seguinte.

É importante que a liderança esteja a todo momento preocupada em como passar a cultura no dia-a-dia. É interessante criar ritos que estejam em alinhamento com as novas ideias. Ritos nada mais são do que momentos e práticas em que a cultura - e, portanto, o foco da organização no caso de uma cultura de resultados – é lembrada. Ritos estão para cultura assim como processos estão para estratégia.

Também é vital que o membro tenha contato coma cultura em diversas oportunidades, pois isso é o que vai levar a internalização. Os processos da organização devem estar alinhados com a cultura. Exemplificando, se a sua cultura é colaborativa faz mais sentido premiar os membros por desempenho grupal do que por desempenho individual. É necessário termos definido que a primeira versão da cultura não é absoluta. Não só os membros e os hábitos mudam, como também o contexto, a geração, entre outros fatores. Sendo assim, a cultura se adapta à uma nova realidade, mudando de forma consciente, não se "deixando levar".

Por fim, uma vez que a cultura seja aplicada, é necessário medir seus resultados. Uma vez que o foco da empresa foi definido e a cultura foi moldada em cima disso subintende-se que os membros se voltarão para atingir tais resultados. Quanto mais próxima a empresa está de atingir os resultados que sua nova cultua assumem como foco para a organização e para os membros, mais forte podemos dizer que é a cultura. Para uma empresa júnior é vital que o foco em resultados esteja na cultura já que nós estamos pensando em formar empreendedores e não existe empreendedorismo em resultados.

"Na minha opinião, não existe formação boa dentro do MEJ sem foco em resultados, sem foco nos clientes. Se você está fomentando uma cultura na sua empresa que não tem esses elementos, você corre o risco de não preparar as pessoas para o mundo real, onde não apenas elas serão julgadas pelos seus resultados, como os resultados são fundamentais para a sobrevivência das organizações de que fazem parte.” - Pedro Nascimento

Algumas dicas para lidar com este processo.

- Todos têm que estar envolvidos no processo de mudança necessariamente. Os membros precisam sentir que a nova cultura tem uma parte deles também.

- Lembre-se que a cultura ideal é um pouco do que a empresa tem de bom hoje e o que mais a empresa quer ter de bom no futuro

- A alta rotatividade de uma empresa júnior garante novos membros com um novo mindset a cada semestre o que é algo positivo quando queremos implementar uma mudança de cultura. Devemos usar a rotatividade a nosso favor

- As práticas de gestão devem estar alinhadas com a cultura.

Por fim, é importante ressaltar que este é um processo que demora meses. É preciso ser paciente e persistente, pois é um processo possível de ser realizado. Casos de organizações que conseguiram desenvolver uma cultura de resultado forte estão por todo o canto. Conhecemos as mais comuns como o Google e a Ambev, mas não precisamos nos limitar a elas. Empresas como a Menlo Inovations e a Berry Wehmiller são muito menores, mas possuem uma cultura de resultados clara e que vale a pena serem estudadas. No mais, é interessante dar uma olhada no próprio Jeito BJ para ver que esse assunto já foi abordado com sucesso também dentro do MEJ.

Autores: RioJunior, Fluxo Consultoria e Pedro Nascimento - Pós júnior e Vice Presidente da Brasil Júnior em 2014

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